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Sementes da Memória

O Observatório Jovem lança seu novo documentário sobre jovens da comunidade remanescente de quilombo de São José da Serra – Valença/RJ – revelando diálogos e tensões entre o rural e o urbano, a tradição e a modernidade cultural

 

Assista ao filme
 

Uma outra imagem sobre a comunidade remanescente de quilombo São José da Serra, localizado no município de Valença (RJ), é oferecida, através de seus jovens, no filme "Sementes da Memória". O filme volta o olhar para o cotidiano e as narrativas dos jovens, num contexto em que se cruzam identidades rurais, quilombolas e aquelas constituídas em torno da dança do jongo.

Espaço de referência significativa tanto para os jovens quanto para os mais velhos, tidos como guardiões da sabedoria do quilombo, o território comunitário é objeto de disputa entre os atuais "proprietários" e os cerca de 150 moradores do quilombo. Seus antepassados ocupam a terra desde aproximadamente o ano de 1850. Atualmente vivem da agricultura de subsistência, do escasso trabalho em outras propriedades em tempos de colheita, da venda do artesanato tradicional produzido pela comunidade e da prestação de serviços nas redondezas. Mais recentemente, o turismo rural promovido pelo fluxo de visitantes em busca das tradições quilombolas tem animado a venda de produtos e serviços prestados pela comunidade.

A visibilidade pública que a comunidade tem alcançado com dança do jongo representa instrumento significativo no processo da luta pela titularidade da terra. O jongo é praticado desde a época da escravidão pelos moradores do quilombo como processo cultural lúdico e religioso. Mais recentemente o jongo tem contribuído para amplificar a voz de seus moradores e levar a luta pela terra para além de seu território, especialmente quando os moradores recebem visitantes nas festas tradicionais da comunidade e nas apresentações públicas para as quais são convidados. O nome de São José da Serra tem sido lembrado quando seus moradores aparecem em programas e reportagens de televisão, documentários e também participando dos encontros anuais de comunidades jongueiras.

São José vive uma espetacularização de seus rituais em vista da necessidade de dar voz às suas reivindicações; é preciso dizer que este processo não se restringe apenas a uma razão meramente utilitária mas que cumpre também importante papel na constituição da auto-estima de seus moradores por valorizar a cultura negra antes marginalizada e vítima de preconceitos na própria região.

Enquanto os espetáculos reforçam imagens tradicionalistas e (re) apresentam a comunidade como exemplo de uma cultura negra intocada que se mantém autêntica – "de raiz" – ao longo da história, o documentário opera com registros distintos desses ao se voltar para o cotidiano do quilombo e a narrativa de seus moradores, em especial os jovens que, ao participarem de diferentes espaços de socialização dentro e fora do quilombo, tornam mais complexas as relações culturais.

No filme estão presentes as relações que esses jovens estabelecem com a tradição, o trabalho, o lazer, o território quilombola e a urbanidade próxima. Entre cotidianos e projetos, se entrelaçam as dúvidas entre o "ficar na comunidade" ou "fugir para a cidade" em busca de oportunidades, a luta pela titulação da terra, as dificuldades para a continuidade dos estudos, a constituição das identidades de jovens e quilombolas, dentre outros enlaces.  Os/as jovens do quilombo – nas fronteiras entre o tradicional e o moderno – revelam complexidades que se ocultam por detrás da simplificada imagem de "comunidade tradicional".

 

Ao longo das entrevistas, os jovens fizeram questão de registrar que não há incompatibilidade entre tradição e modernidade, entre ser jovem, jongueiro e quilombola; que poderiam dançar funk e nem por isso deixariam de ser jongueiros. A jovem Rosimeri explicita desta forma a possibilidade de viver diferentes expressões culturais: "A gente ‘num’ vive só de jongo, a gente ‘num’ dança só jongo".

Sementes da Memória

Confira o trailer em http://www.youtube.com/watch?v=Oj651hHORSQ&feature=player_embedded

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O documentário expressa nosso esforço de produzir reflexão e crítica sobre o a lógica da imagem única e autêntica sobre a qual o jongo-espetáculo se organiza e dá elementos para se pensar uma juventude livre para vivenciar a juvenilidade existente no quilombo que não se resume à dança do jongo, mas dialoga/pratica o "juvenil-popular" que atravessa as fronteiras físicas e culturais entre campo e cidade. O cotidiano desses jovens é atravessado por diálogo, nem sempre fácil, entre as aspirações pessoais e a vida comunitária. O documentário permite perceber que o universo cultural dos jovens não está delimitado pelo território do quilombo, ainda que seja nele que estes encontrem suas referências culturais fundamentais. Ao fazer documentário corre-se o risco de ouvir apenas o que se quer ouvir. Há no filme, entretanto, uma busca por evidenciar o ponto de vista dos narradores – os jovens moradores da comunidade de São José – dando aos entrevistados um espaço próprio de narratividade. Neste sentido evitou-se a utilização de roteiro de entrevistas, os encontros caracterizaram-se mais como conversas entre os jovens e a equipe de pesquisa e filmagem. Buscou-se, desta forma, minimizar a intervenção produzida tanto pela presença da equipe como pela imposição de conteúdos orientadores da produção do filme.Queríamos compartilhar nossas intenções de filmagem e pesquisa e contar, principalmente, com a participação dos jovens da comunidade na definição dos caminhos a serem seguidos pelo filme. O trabalho de campo foi feito majoritariamente durante uma semana no mês de julho de 2005 e teve seu início com uma receptiva conversa de roda com alguns jovens da comunidade para que dissessem o que consideravam importante ser retratado no documentário. O roteiro foi sendo definido ao longo da semana e na medida em que realizávamos as locações de filmagens que ocorreram em espaços significativos do cotidiano dos jovens.