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ProJovem em debate

Educadores e estudantes reunidos no Fórum de EJA no Rio de Janeiro debatem com Secretária Adjunta da Secretaria Nacional de Juventude o recém criado ProJovem que será implantado a partir de julho em 10 capitais

Observatório Jovem   25.05.2005

Educadores reunidos no Fórum de EJA no Rio de Janeiro debatem com Secretária Adjunta da Secretaria Nacional de Juventude o recém-criado ProJovem que será implantado a partir de julho em 10 capitais
 
No último dia 18 de abril aconteceu, na UERJ, o debate sobre o ProJovem - Programa Nacional de Inclusão de Jovens, que contou com a presença da profª. Regina Novaes, Secretária Adjunta da recém-lançada Secretaria Nacional de Juventude [i]. Com um público bem diversificado e representações de vários municípios do estado do Rio de Janeiro, o debate transcorreu com intervenções qualificadas que possibilitaram a sinalização de vários desafios tanto para o governo quanto para a sociedade civil.
 
Regina Novaes iniciou sua exposição apresentando a Política Nacional de Juventude lançada em 1º de fevereiro do corrente ano, através de medida provisória. Essa política está baseada no tripé: Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), ProJovem e Conselho Nacional de Juventude (CNJ), este último ainda em formação.
 
Segundo ela, o papel da Secretaria é articular, interministerialmente, a inclusão da perspectiva geracional como foco principal de suas ações. Já o Conselho, de caráter consultivo, será constituído por 1/3 de representação do governo e 2/3 de organizações juvenis ou daquelas que trabalhem com jovens. A secretária-adjunta espera que o Conselho goze de autonomia e legitimidade suficientes para tornar-se referência na validação de projetos e que possa inibir tantos outros que não tenham essa perspectiva. Possivelmente seja esta a mais importante inovação trazida pela Política Nacional de Juventude: a introdução da perspectiva geracional, não só pela criação da Secretaria e do Conselho, mas também pela proposta de provocar outros ministérios a também assumirem esta dimensão em suas ações.
 
O ProJovem é um programa de educação, qualificação e ação comunitária, dirigido a jovens de 18 a 24 anos que tenham concluído a 4ª série e não tenham concluído a 8ª série do Ensino Fundamental. O outro critério para ingresso no programa é que os jovens estejam fora da escola e do mercado de trabalho formal. Os/as jovens receberão, mensalmente, um auxílio financeiro de R$ 100,00 que, segundo Novaes, “não é bolsa, nem transferência de renda”, mas sim um recurso que eles/as podem usar para suprir suas necessidades específicas.
 
Aprovado pelo Conselho Nacional de Educação com base em um artigo específico da LDB – o Art. 81, segundo o qual o governo federal pode intervir em situações de emergência podem-se organizar cursos ou instituições de ensino especiais experimentais, desde que obedecidas as disposições legais – esse Programa, de acordo com a expositora, não pode ser identificado como Educação de Jovens e Adultos (EJA). Esta afirmação foi objeto de intensa discussão entre os/as participantes. Segundo Regina Novaes, a não-inserção no campo de EJA tem a preocupação de não tirar do foco que essa é uma política de juventude, de caráter emergencial e, efetivamente, experimental. Para ela, em alguns casos, políticas como EJA e ProJovem não devem ser integradas sob pena de perda de mobilidade. Contudo, caminhando separadamente, elas poderiam manter seus objetivos claros e assim se ajudar muito mais, o que não quer dizer que em algum momento não possam vir a se juntar. Ainda segundo Regina, outra vantagem apresentada refere-se ao fato de o/a jovem, de forma autônoma, poder escolher entre ensino regular, EJA e o ProJovem.
 
A formação profissional será feita de acordo com as realidades locais. Os municípios – inicialmente as capitais – escolhem algumas “famílias profissionais”, ou seja, conjuntos de ocupações relacionadas, que tenham base técnica comum. “A opção foi esta formação mais ampla, não cursos muito específicos”, afirmou Regina. Em cada uma das “famílias” haverá no currículo noções que possibilitem: trabalho assalariado, empreendedorismo, economia solidária ou associativismo. A ação comunitária, entendida como estágio civil e não como contrapartida ao auxílio-financeiro, estará relacionada à “família profissional” que o/a jovem escolher.
 
Quanto ao anseio de que o Programa chegue a outras cidades, Regina Novaes diz que a proposta é, a partir dessa experiência nas capitais, adaptar o Programa para sua implementação em outras cidades, o que não acontecerá nesse primeiro momento por falta de recursos. Porém, essa já seria uma preocupação, inclusive do relator da medida provisória, o Deputado André Figueiredo (CE).
 
A semelhança do ProJovem com outros programas, tais como o do Primeiro Emprego, Agente Jovem e Jovens Pela Paz – este último desenvolvido pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro –, também foi alvo de questionamento pelos participantes do Fórum. Indagou-se também sobre as expectativas do governo federal frente à integração no mundo do trabalho dos jovens após a realização do curso, considerando-se que já existem evidências suficientes de que cursos ligeiros de qualificação profissional são pouco efetivos no enfrentamento do desemprego juvenil. Sobre isso, Regina Novaes diz que, além da diferença no recorte etário, esse programa pretende experimentar uma outra forma de estabelecer a relação entre ensino fundamental, qualificação profissional e ação comunitária. Ao ser comparado também ao Mobral e a outras experiências emergenciais semelhantes – o que foi apontado como uma possível falta de originalidade do ProJovem –, a Secretária Adjunta afirmou que quaisquer mudanças dependerão das questões que estão colocadas na e pela sociedade e que a efetividade do Programa dependerá também de como ele será colocado em prática, ou seja, como será monitorado. Além disso, complementou, os mecanismos de pressão utilizados pela sociedade a fim de garantir a efetivação do mesmo serão fundamentais para a sua continuidade e expansão.
 
No debate foi apontado, ainda, o inconveniente político de se produzir um descompasso entre a criação e execução do ProJovem antes mesmo do início dos trabalhos do Conselho Nacional de Juventude. Regina informou que a oportunidade de lançar o Programa não poderia ser desperdiçada, já que o governo federal disponibilizou R$ 311 milhões não-contingenciados para o ProJovem. Então, justificou, “era preciso usar o recurso da melhor maneira e imediatamente; deixar para depois era correr o risco de não fazer e, com isso, perder a verba disponível”.
 
Outra questão apresentada esteve relacionada ao fato de o Programa estar voltado para o ensino fundamental, uma vez que se sabe que o “gargalo” do sistema educacional está no ensino médio e que esta é a escolaridade preferencialmente exigida dos jovens para ingresso no mercado de trabalho. Novaes respondeu que, de fato, a proposta inicial era de que aquele estivesse voltado para o ensino médio – inclusive essa foi a sugestão apontada pelo relatório do Projeto Juventude do Instituto Cidadania –, mas “diante do número de jovens que não tinham terminado o ensino fundamental e considerando que este é anterior ao médio, não se teve outra opção”. 
 
Também houve perguntas quanto à participação das universidades e dos centros de formação profissional no desenvolvimento do Programa. Regina Novaes informou que haverá uma rede de centros universitários federais que cuidará do monitoramento e avaliação do Programa. Outras articulações não foram viáveis em nível federal, o indicativo é que sejam feitas em nível local, esclareceu.
 
A apresentação do ProJovem pela prof.ª Regina Novaes evidenciou algumas de suas características positivas, tais como a incorporação de pressupostos conceituais do contemporâneo debate sobre os direitos da juventude, numa clara contraposição às posições tradicionais de pensar políticas públicas de juventude pela ótica dos “problemas sociais”. Destaca-se também a adoção da perspectiva multidisciplinar indicada para seu currículo, além do referido enfoque que busca reforçar e disseminar a inclusão do debate sobre gerações na formulação de políticas que atuem sobre os contemporâneos e contraditórios processos de passagem dos jovens para a vida adulta. Todavia, a impressão compartilhada por muitos/as participantes do Fórum é que o ProJovem talvez não seja portador de tanta novidade quanto o governo federal anuncia. Algumas questões de natureza estrutural ainda precisam ser enfrentadas, dentre elas a inserção desses/as jovens qualificados/as no mundo do trabalho e a continuidade de seus estudos. O governo federal parece, contudo, não ter respostas para além da estratégia da emergência e da focalização. O que se percebe é que com seu caráter emergencial, portanto sem pretensão de continuidade, o ProJovem corre o risco de acontecer sem contribuir para a melhoria ou fortalecimento do ensino regular, compreendido como política pública permanente e universal.
 
O ProJovem parece se inscrever no quadro de dificuldades que o Governo Lula enfrenta para  promover ações que causem impactos duradouros no campo das desigualdades estruturais que afetam o conjunto da sociedade brasileira. O caráter de emergência do ProJovem pode ser compreendido também como uma descontinuidade institucional programada e sem compromisso com o estancamento do fluxo incessante de produção de jovens de baixa escolaridade. O ProJovem acerta no diagnóstico de que é preciso construir escolas sintonizadas com os interesses da juventude, mas se apresenta como escola eventual e acelerada, sem pretensão de alterar as estruturas produtoras da exclusão dos jovens no sistema escolar.
 
A participação da Secretária Adjunta no debate foi animadora, por demonstrar a disposição da nova Secretaria de Juventude em dialogar com a sociedade sobre o ProJovem, carro-chefe da nova política federal de juventude. O desafio é seguirmos dialogando cada vez mais e acompanhando criticamente a implantação do Programa junto às prefeituras.
 
Colaboraram com a matéria:
Ana Karina Brenner, Carlos Henrique Martins, Julia Zanetti e Paulo Carrano

 

[i] O encontro foi promovido pelo Fórum de Educação de Jovens e Adultos do Estado do Rio de Janeiro, em parceria com a ActionAid, o Observatório Jovem do Rio de Janeiro/UFF, o ISER-Assessoria, o IBASE, o Laboratório de Políticas Públicas – LPP/UERJ, a Faculdade de Educação da UERJ (área de EJA) e a UNIRIO.

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