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Mídia perde o foco ao falar da maioridade penal

Após morte do menino João Hélio, maioridade penal é novamente pauta em grandes jornais, porém, a "regra básica" de consultar todos os lados envolvidos no assunto tem sido frequentemente esquecida

As imagens vinham em flashes: o sangue na lataria do carro, a foto do menino, os depoimentos dos pais e da irmã, com um fundo musical que abusava da emotividade. Impossível não se chocar com um crime bárbaro como o cometido no dia sete de fevereiro, que teve como vítima fatal o menino João Hélio Fernandes Vieites, de 6 anos.

Por vários dias o crime esteve em pauta nos jornais de maior circulação. Porém, a exploração da comoção nacional por tal fato foi visível. Tomando como ponto principal a participação de um menor de idade no assalto, a discussão sobre a diminuição da maioridade penal foi retomada por políticos, meios de comunicação e sociedade. A discussão está sendo feita, tendo como pano de fundo as cenas da morte de João. Com o sangue ainda quente, a razão é deixada de lado para dar espaço ao sentimento de revolta.

Enquanto a sociedade era questionada, nas ruas e nos sites, sobre como deveria ser penalizado o adolescente envolvido no crime, as instituições especializadas em juventude foram simplesmente deixadas de lado. Uma enquete promovida pelo Globo Online perguntava: "Você acha que um menor autor de crime bárbaro deve estar sujeito a pena como qualquer adulto?" 88.32% dos votantes responderam que sim.

Mas na pergunta não estava escrito que todo menor autor de crime bárbaro está sujeito a penas legalmente estabelecidas – segundo a Lei 8069/90 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os autores de ato infracional são submetidos a julgamento pelo Poder Judiciário. A diferença está na penalidade, pois pessoas adultas vão para instituições carcerárias e crianças e adolescentes são expostas a medidas sócio-educativas e podem ter pena de reclusão em instituições sócio-educativas (como a FEBEM).

Uma das manchetes dos jornais O Globo, O Globo Online e CBN, no dia seguinte ao latrocínio (roubo seguido de morte) que terminou na morte de João, dizia: "Menor envolvido na morte de menino ficará preso por no máximo três anos". No artigo o jornalista afirma que o ECA "reforça a sensação de impunidade". A família é citada inúmeras vezes, assim como a polícia. Entretanto, autoridades do assunto, mais uma vez, não são nem mesmo mencionadas.

Instituições ligadas à juventude são contra mudança nas leis

O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), principal órgão do sistema de garantias dos direitos da infância e juventude do país afirmou em carta que é contra as mudanças de lei propostas. Entre outros dados, ressalta que "segundo pesquisas já realizadas sobre a reincidência criminal, as taxas de reincidentes que cumpriram pena nas penitenciárias ultrapassam 60%, enquanto no sistema sócio-educativo se situam abaixo de 20%".

O CONANDA, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos e a Associação Brasileira dos Magistrados e Promotores Públicos elaboraram um projeto de lei para a implementação do Sistema Nacional de Atendimento Sócio-Educativo (SINASE). Segundo as entidades este seria um sistema adequado para que se cumpram as medidas já definidas por lei, considerando, por exemplo, padrão arquitetônico, projeto político pedagógico das unidades de internação e responsabilidade de prever recursos no orçamento da União, dos Estados e Municípios, sem deixar de lado as diferenças (não só etárias, como psicológicas) entre jovens e adultos.

Publicado no jornal Fazendo Media