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Democracia e participação: reflexões a partir da 1ª Conferência de Políticas Públicas de Juventude

Os pesquisadores Patrícia Lânes e Maurício Santoro discutem em artigo a recente cena brasileira da participação juvenil e o processo de realização da 1a Conferência Nacional de Juventude
A democracia tem como princípios a liberdade, a diversidade, a
solidariedade, a igualdade e a participação. O sociólogo Hebert de
Souza, o Betinho, escreveu que é preciso a união desses ideais para que
a democracia exista. Também afirmou que ela é obra inesgotável, ainda
em processo de aperfeiçoamento em todo o mundo. Portanto, refletir
sobre os espaços e processos democráticos no Brasil de hoje é lembrar
de que eles estão sendo criados por toda sociedade e por cada um de
nós. Nas palavras de Betinho: “A democracia é o futuro que se constrói
hoje através da ação e da participação de todos e de cada um. (...) A
democracia não é um atalho, mas um caminho”.

A formação de conselhos e a realização de conferências que reúnem representantes da sociedade civil e do governo  para debater os rumos das políticas públicas é uma das inovações da redemocratização do Brasil. Desde a década de 1980, consolidaram-se iniciativas participativas como essas em setores como proteção à criança e ao adolescente, saúde e direitos humanos, que já realizaram dezenas de conferências. Outros campos, como políticas de promoção da igualdade racial e de defesa dos direitos das mulheres, têm experiência bem mais recente com tais medidas. A 1ª Conferência Nacional  de Políticas Públicas de Juventude é o um dos mais novos frutos do processo.

Levantamento coordenado pelo Ibase no projeto Monitoramento Ativo da Participação Social avaliou os principais avanços e obstáculos dos conselhos e das conferências. Entre os pontos positivos, destacam-se a construção de diálogos entre o poder público e a sociedade, mais transparência na formulação de políticas públicas e circulação aprofundada das informações relevantes. Entre os problemas: o esvaziamento de muitos desses espaços; a baixa influência institucional – que ocasionalmente os faz dependentes de personalidades carismáticas que possam liderar os esforços de articulação;  as dificuldades de organizações e movimentos sociais participarem nos vários espaços de debate, devido à escassez de recursos financeiros e humanos; as possibilidades de manipulação oficial dos processos participativos, utilizando-os para tentar legitimar decisões tomadas de antemão.

Nos últimos dias de abril aconteceu em Brasília a 1ª Conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude, da qual participaram aproximadamente 2 mil pessoas, entre  delegados(as) e convidados(as). O processo chegou a mobilizar, de acordo com a Secretaria Nacional de Juventude, mais de 400 mil pessoas, entre jovens, técnicos, educadores(as), gestores públicos etc. Foram realizadas conferências estaduais, municipais, pré-conferências e conferências livres sobre variadas temáticas, envolvendo  os mais diferentes segmentos de movimentos e organizações juvenis.

A Conferência é um marco no debate sobre políticas públicas de juventude no país, apesar de não ser o ponto zero do assunto. Desde meados da década de 1990, seja através de organizações não governamentais e movimentos sociais, seja em administrações públicas municipais, o debate vem ganhando força gradativamente.

Em março de 2004, o governo federal instalou o Grupo Interministerial de Juventude, formado por representantes de 19 ministérios e secretarias especiais, com o objetivo de identificar os principais desafios da juventude brasileira e pensar uma Política Nacional Integrada de Juventude. Em junho do mesmo ano, a Câmara dos Deputados, através da Comissão Especial Destinada a Acompanhar e a Estudar Propostas de Políticas Públicas para a Juventude, realizou processo de consulta pública, com audiências públicas e seminários estaduais,  culminando com encontro nacional que deu origem a um Plano de Juventude (PL 4530/04), que hoje tramita na Câmara.

Em 2003, o Instituto Cidadania e a Fundação Perseu Abramo organizaram  debates regionais como parte de seu “Projeto Juventude”, produzindo dois livros a partir dos dados da pesquisa realizada nessa iniciativa e também  publicação reunindo propostas para políticas públicas de juventude. (BRENNER, LÂNES, CARRANO, 2005) Em termos de análise acadêmica, já pode se dizer que há um acúmulo razoável sobre o tema se considerado além no Instituto Cidadania, surveys e pesquisas qualitativas realizadas por entidades como Unesco, Ibase/ Pólis, e universidades públicas como USP, UFF, UFMG.

Ainda assim, a Conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude  continua sendo uma conquista para o debate. Foi realizada a partir de órgão federal criado para trabalhar o  tema (Secretaria Nacional de Juventude) e de instância de interlocução entre poder público e sociedade civil (Conselho Nacional de Juventude, Conjuve), ambos formados em 2005. Na Conferência foram aprovadas 69 resoluções para as políticas públicas de juventude (PPJs), dentre elas 22 prioridades que deverão ser acompanhadas/monitoradas de forma mais sistemática pelo Conselho e pela sociedade civil organizada como um todo.

Se a Conferência tem grande peso político e de mobilização é necessário refletir sobre seus avanços e também sobre seus limites. E, ainda, sobre desafios para os mecanismos de participação que estão longe de serem exclusivos do campo de debate sobre juventude ou deste evento em especial.

A Conferência como processo

O processo de mobilização que precedeu a Conferência Nacional de PPJ reuniu mais de 400 mil pessoas. De acordo com o governo federal, foram realizadas etapas estaduais em 27 unidades da federação, reunindo mais de 24 mil pessoas e elegendo 1210 delegados(as) para a etapa nacional. Nos municípios, foram 308 conferências.

Segundo a Secretaria Nacional de Juventude, “(...) o processo de realização das etapas municipais foi muito importante para ampliar a rede institucional relacionada à juventude nesta esfera da Federação. Antes do início do processo havia registro de menos de 100 órgãos municipais de juventude, hoje já são cerca de 250.”

Além das etapas municipais e estaduais, foram realizadas, ainda, 401 conferências livres, envolvendo 70 mil pessoas e cerca de 350 organizações. Os principais promotores desse tipo de modalidade de conferência foram os movimentos sociais e ONGs, seguidos dos mandatos parlamentares e programas de governo.

Tal mobilização envolvendo o debate sobre PPJ desconstrói, uma vez mais, as generalizações que enxergam a juventude como um todo monolítico e alienado, incapaz de se ocupar com processos de crítica e transformação da sociedade. Há cerca de 50 milhões de jovens no Brasil – uma geração que nasceu e cresceu sob a retomada da democracia. Pesquisas coordenadas pelo Ibase e pelo Instituto Pólis em 2005 e 2007 mostram interesse da juventude em participar da política (entre oito mil entrevistados, 85% declararam ser necessário maior diálogo entre cidadãos e governos), ainda que tal vontade seja dificultada pela falta de informação, pelo transporte deficiente e pelo tempo escasso de quem precisa conciliar trabalho e estudo. Os(As) jovens se sentem distantes das instituições formais que discutem a política, e críticos(as) diante de quem os representa, embora depositem no Estado grandes expectativas para as soluções de seus problemas.

Neste contexto, a Conferência pode ser entendida, sobretudo, como um espaço onde demandas e bandeiras puderam se fazer ecoar. Não se trata de uma visão romântica onde todos(as) têm igual espaço para se colocar. O processo é também um espaço de luta política onde movimentos e organizações juvenis que já são visíveis e têm maior legitimidade social buscam reafirmar seu lugar (se colocando algumas vezes como “porta-vozes” da juventude), ao mesmo tempo em que expressões mais recentes da organização batalham por maior espaço para as suas pautas. No caso da Conferência Nacional, tampouco trata-se de um espaço exclusivamente juvenil, uma vez que do campo das PPJs também participam atores do mundo adulto, como lideranças de movimentos dos quais os(as) jovens participam; técnicos(as) de ONGs e projetos sociais; gestores(as) de políticas públicas.

Nesse cenário, como apontou a antropóloga e ex-presidente do Conjuve, Regina Reyes Novaes, há muitas alianças possíveis que são combinadas de acordo com a questão em pauta e com o contexto político. Em sua análise sobre o conselho aponta que “(...) nas discussões e deliberações entre conselheiros e conselheiras da sociedade civil e dos diferentes ministérios e órgãos revelam-se outras alianças e contraposições baseadas em diferenças geracionais, de concepções, de causas, de visões sobre prioridades, meios e fins”.

Isso também se expressou no processo da Conferência. Para além das alianças entre setores da sociedade civil organizada, houve acordos entre setores do poder público e entre as duas esferas. As Conferências municipais e estaduais expressaram a correlação de forças local, tornando público, através de conflitos, negociações e acordos, o debate e as disputas em torno das PPJs. Em diversos estados, por exemplo, houve manifestações públicas de grupos e movimentos contra a forma de organização do evento, sua condução ou concepção, o que rendeu uma série de cartas e manifestos (escritos ou audio-visuais) que foram posteriormente divulgados através da Internet.

Metodologias: avanços e desafios

Um aspecto fundamental para a realização de qualquer conferência é a metodologia utilizada, ou seja, a maneira através da qual os debates conceituais e as disputas políticas irão acontecer na prática. A organização da Conferência Nacional trilhou caminhos interessantes nesse sentido. Por um lado, a partir da concepção de sua estrutura, abriu a possibilidade para que este processo acontecesse para além das institucionalidades. Se as conferências municipais e estaduais precisavam de um órgão do Estado daquele âmbito para acontecerem e elegerem representantes para a etapa seguinte, as pré-conferências e conferências livres mostraram-se bastante profícuas ao abrirem a possibilidade de setores da sociedade civil e do poder público ampliarem o diálogo junto a jovens, tanto na perspectiva de “prepará-los(as)” para participar das etapas “institucionalizadas”, quanto no de dar eco para pautas que, de outro modo, acabariam invisíveis dentro de  dinâmica mais ampla.

As conferências livres foram a grande surpresa do processo ao reunir cerca de 70 mil pessoas em torno de temas como o voto aos 16 anos, mídia, tempo livre, cultura e lazer, meio ambiente, as questões raciais, de gênero e GLBTT, entre muitas outras, além de ter contado com a participação, por exemplo, da juventude universitária e de jovens de comunidades tradicionais. Esta modalidade tornou possível, ainda, a participação de segmentos da juventude que, de outra forma, estariam alijados do processo, caso, por exemplo, de jovens que cumpriam medidas sócio-educativas, encontrando-se privados(as) de liberdade.

A dinâmica do encontro nacional, realizado entre os dias 27 e 30 de abril, em Brasília, pode ser resumida da seguinte maneira: Dia 1 - solenidade de abertura com autoridades governamentais, seguida de “mesa de contextualização” sobre PPJs. Dia 2: grupos de trabalho e realização de oficinas autogestionadas. Dia 3: momento interativo e plenárias para aprovar resoluções e prioridades. Dia 4: plenária final para debater moções de apoio e repúdio.

No que diz respeito à realização da Conferência Nacional de PPJs, os Grupos de Trabalho (Gts) temáticos ajudaram a organizar o debate em torno das políticas públicas. Seu amplo espectro ia desde de questões tradicionais do movimento de juventude como educação, trabalho e cultura; passando pelas identidades específicas, como juventude negra, mulheres jovens, juventude GLBTT, jovens com deficiência e jovens do campo; e indo até o debate sobre política e participação e a institucionalização das políticas públicas de juventude.

Durante a Conferência Nacional, pensando no número de cerca de 2 mil participantes, muitos dos 23 GTs estiveram esvaziados, com 30/40 participantes. Deve-se avaliar a variação da adesão segundo temas e interesse, mas pode-se ponderar que em um evento tão grande, mesmo sendo o debate sobre as PPJs o foco principal, nem todos(as) os presentes efetivamente tomam parte da discussão de forma permanente. Neste sentido, a conferência também pode ser lida como oportunidade para que grupos, redes e fóruns de juventudes criem seus espaços de discussão e de expressão, independente da dinâmica formal em curso ou da programação oficial do evento.

No entanto, ainda sobre os Grupos do Trabalho, é preciso ponderar sobre o que eles nos revelam sobre a composição dos temas/ demandas que traduzem o debate sobre PPJ hoje no país. De acordo com a socióloga Helena Abramo, no relatório brasileiro da pesquisa “Juventude e Integração Sul-Americana: caracterização de situações-tipo e organizações juvenis” (Ibase/ Pólis, 2006), “(...) no plano político, ainda é incipiente o debate sobre o que é comum à juventude e, portanto, quais seriam as pautas comuns aos jovens brasileiros” (p. 13) , ao mesmo tempo em que a usual utilização do termo “juventude” no plural busca chamar a atenção para as diferenças e desigualdades existentes.

No que diz respeito às identidades específicas juvenis (negros(as); mulheres; cidade/campo; deficientes; GLBTT etc) continua evidente a tensão presente entre dar visibilidade e espaço para que essas juventudes, que assim se auto-reconhecem, expressem questões e demandas específicas e integrar estes mesmos sujeitos aos debates que, por terem caráter mais universal (como educação, trabalho, saúde, cultura etc), necessitam do olhar específico para não perder o vínculo com o que é vivido no cotidiano.

Esta questão também se colocou de forma contundente na primeira gestão do Conselho Nacional de Juventude, e nos faz refletir sobre perdas e ganhos ao tratar o específico de forma setorizada ou de se buscar incluí-lo em debates mais amplos, que muitas vezes tornam invisível a questão. Na verdade, talvez não se trate de algo a ser “resolvido” mas é importante que seja permanentemente problematizado já que se trata de componente da maneira como se organizam hoje as pautas de movimentos e organizações de juventude, ou que trabalham com jovens, no país.

Se houve avanços significativos em termos do método criado para a realização da Conferência, é preciso também apontar alguns de seus limites. A falta de espaços para aprovação em plenária do Regimento Interno, que era ratificado apenas pelos(as) participantes das comissões organizadoras; a opção pelo debate em plenária apenas dos últimos desafios/ propostas mais votados; e o fato de os(as) conselheiros(as) de juventude serem, a priori, delegados(as) natos(as) são aspectos metodológicos sobre os quais houve polêmica.

Nesse mesmo sentido, é preciso avançar na concepção do “momento interativo”, espaço na conferência onde os(as) delegados(as) recebiam adesivos que deveriam ser colocados nas propostas (definidas pelos GTs) de sua preferência. De acordo com o método, cada delegado(a) podia colar, no máximo, três adesivos em uma mesma proposta. A dinâmica se mostrou pouco adequada, pois a fiscalização praticamente inexistiu, abrindo a possibilidade de que uma mesma pessoa colasse, por exemplo, todos os seus  adesivos em uma mesma proposta. Neste momento, era possível que pessoas dos Grupos do Trabalho ficassem próximas às suas propostas/ desafios, pedindo “votos” e fazendo “propaganda” daquelas que julgavam mais importantes.

É importante investir na criação de métodos que tornem momentos da conferência menos burocráticos e enfadonhos, sobretudo se pensamos que boa parte dos(as) jovens presentes não tinha experiência em espaços de participação como os do evento. No entanto, é essencial que os métodos escolhidos sejam capazes de garantir a idoneidade do processo. Este aspecto precisa ser avaliado com muito cuidado para que se avance nas próximas conferências.

Dentre os ganhos deste evento, está também a realização de pesquisa sobre o perfil de seus(suas) participantes, coordenada pelas sociólogas Miriam Abramovay e Mary Castro, que contou com aplicação de questionário junto a 1827 participantes e a realização de 30 Grupos Focais, envolvendo cerca de 30 representantes de redes, fóruns, partidos, movimentos e grupos identitários. O levantamento pode ajudar a mapear o universo do debate das PPJs e a se conhecer melhor a realidade desta conferência. Talvez, assim, seja possível criar condições de participação ainda mais adequadas ao perfil de seus(suas) participantes.

Neste sentido, a preocupação com a mobilização de jovens que trabalham com mídia e comunicação em diferentes grupos e redes, para fazer a cobertura jornalística do evento, coordenada pela revista Viração, se mostrou coerente com o princípio de participação, visibilidade de expressão de uma importante parcela de juventude .

Outro ganho significativo foi a ampla cooperação internacional desenvolvida pelo Brasil na área de PPJs, em particular com a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e com a Organização Ibero-Americana de Juventude (OIJ). A presença de delegações desses países propiciou rica troca de experiências, que confirmaram o quanto o Brasil tem a aprender e ensinar no convívio com esses Estados. Por exemplo, acompanhar iniciativas como aquelas adotadas pela CPLP, nos quais leis exigem que o conselho de juventude seja ouvido pelo parlamento quando estiver em discussão projeto de legislação que afete a população jovem.

Os debates no âmbito da OIJ estiveram focados na proposta brasileira de aderir à Convenção Ibero-Americana dos Direitos da Juventude. Embora o tratado seja bem avaliado pela sociedade civil, há dúvidas se sua ratificação neste momento seria benéfica. Muitos acreditam que o melhor caminho seria aprovar primeiro o marco legal doméstico (Estatuto da Juventude, Plano Nacional de Juventude) e só depois assumir compromissos internacionais que reforçassem as leis internas.

Nesse sentido, é fundamental a continuidade e o aprofundamento do diálogo com o Congresso Nacional. Representantes da conferência foram recebidos(as) em audiência pelo presidente da Câmara dos Deputados e lhe fizeram duas solicitações: 1) a de que se empenhasse pela aprovação da proposta de emenda constitucional 138/03, que introduz o termo “jovem” na Constituição (a exemplo do que já ocorre com idosos, crianças e adolescentes); 2) a de que a  Câmara ratifique a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada recentemente pela ONU.

Propostas e prioridades

Ao final da Conferência foram eleitas 69 resoluções e, dentre elas, 22 prioridades. As 18 mais votadas no momento interativo foram apenas apresentadas durante a plenária final. As que passaram por votação em plenária foram as 19ª, 20ª, 21ª e 22ª. Sobre as prioritárias, importante pontuar terem sido aprovadas três relativas à cultura; duas à segurança; duas sobre juventude do campo  e duas ao “fortalecimento institucional” das PPJs.

Foram aprovadas também duas propostas vindas da área de educação: uma relativa à “educação básica – elevação da escolaridade” e uma relativa à “educação superior”. Trabalho, meio ambiente, esporte, política e participação; jovens mulheres; povos e comunidades tradicionais; Cidadania GLBT e jovens com deficiência tiveram uma proposta aprovada como prioridade cada . É importante ressaltar que em diversos casos, como o das jovens mulheres, a prioridade eleita expressava bandeiras históricas do movimento (neste caso, a legalização do aborto faz parte da proposta eleita como 11ª prioridade).

Destaque especial deve ser dado ao fato da proposta do GT “Jovens negros e negras” ter sido a mais votada da conferência, com 634 votos. Nela foram referendadas as resoluções do 1º Encontro Nacional de Juventude Negra (ENJUNE), realizado em julho de 2007, na Bahia, pedindo-se seu reconhecimento e transformação em PPJ.

Importante que seja feito esforço de análise para compreender o conteúdo de cada uma das resoluções e prioridades tiradas em sua relação com o contexto das PPJs. Outra importante análise será sobre a composição do mosaico formado a partir das propostas elaboradas na Conferência. Por ora, é possível reafirmar apenas que a pluralidade das propostas mais votadas reflete, por um lado, as relações de força entre distintos movimentos, partidos políticos, entidades, organizações sociais e diferentes setores do governo, e as possibilidades e limites do processo em que se deu tal escolha. Pode-se falar, também, de um considerável avanço de composição que, mais uma vez, revela a pluralidade presente neste campo.

A Conferência é, portanto, importante avanço na consolidação da nossa recente democracia. Pode ajudar a tornar concretos valores como a participação e a diversidade. Ajuda, ainda, a criar canais para que essa participação se dê na prática. Apostar em mecanismos da chamada democracia participativa, como as conferências, significa também “(...) uma forma de adensamento da relação Estado-sociedade civil, que vem colaborar com o processo de alargamento da democracia nas sociedades contemporâneas”. (Moroni, 2005) É preciso continuar a investir na ampliação desses espaços e em mais transparência neles.

Permanecem desafios, para governo e sociedade civil, de dar sentido e conseqüência à experiência participativa de milhares de jovens que, de alguma forma, se envolveram na conferência. De acordo com a cientista política Ana Cláudia Teixeira, “A impressão é que as experiências participativas no Brasil, mundialmente reconhecidas, 'correm por fora', ficando na periferia do sistema, afetando pontualmente uma ou outra política setorial, a depender da vontade política dos governos e/ou do poder de pressão da sociedade organizada”. (Le Monde Diplomatique Brasil, 2008)

No caso das PPJs, após a realização da conferência e da ampla mobilização social em seu processo, é tempo de reconhecer quais mecanismos podem ajudar a monitorar a efetivação das resoluções e ampliar a capacidade de sua influência nas pautas governamentais em todos os níveis. Para isso, será necessário a ampliação dos espaços de articulação da sociedade civil mobilizada a partir desta temática (como fóruns, redes, articulações etc), mas também a maior apropriação de espaços de interlocução entre poder público e sociedade, como o Conselho Nacional de Juventude. Este, em particular, ganha relevância no monitoramento das PPJs existentes, e também na transformação das resoluções da Conferência em realidade. E isso só será possível com pressão social permanente e negociação constante entre muitos interesses e perspectivas que conformam o campo das PPJs no Brasil.

*Patrícia Lânes- Socióloga, pesquisadora do Ibase e do Observatório Jovem do RJ/ UFF.
*Maurício Santoro- Cientista politico, pesquisador do Ibase e Conselheiro Nacional de Juventude.

Sites
http://www.juventude.gov.br/conferencia                       

http://www.revistaviracao.com.br/juventude/ 

Bibliografia

ABRAMO, Helena. “Relatório nacional – Brasil – Juventude e Integração Sul-Americana: caracterização de situações-tipo e organizações juvenis”. Ibase/ Pólis, novembro de 2007.

BRENNER, Ana Karina; LÂNES, Patrícia; CARRANO, Paulo César R. “A arena das políticas públicas de juventude no Brasil: processos sociais e propostas políticas”. In: JOVENes – Revista de Estudios sobre Juventud. Centro de Investigación y Estudios sobre Juventud e Instituto Mexicano de la Juventude. Ano 9, Número 22, janeiro-junho 2005.

MORONI, José Antônio. “Participamos, e daí?” Texto para debate. Observatório da Cidadania, novembro de 2005.

NOVAES, Regina. “Políticas de Juventude no Brasil: continuidades e rupturas”. Juventude e Contemporaneidade. Coleção Educação para Todos, MEC e UNESCO, 2004

SOUZA, Herbert de. “Democracia e Cidadania”. In: RODRIGUES, Carla (org.). Democracia: cinco princípios e um fim. Coleção Polêmica, Ed. Moderna, 2ª Ed., São Paulo, 1996.

TEIXEIRA, Ana Cláudia. “Até onde vai a participação cidadã?”. Le Monde Diplomatique  Brasil. Ano 2, Número 7, Fevereiro de 2008.